A RESPONSABILIDADE DOS DIRIGENTES DAS ENTIDADES DO SISTEMA NACIONAL DO DESPORTO
Por Talita Novaes
A Lei nº 14.073, de 14 outubro de 2020, trata de ações emergenciais ao setor esportivo, trazendo algumas alterações à Lei 9.615/98 (Lei Pelé). Em relação aos dirigentes das entidades do Sistema Nacional do Desporto, a Lei 14.073/20 acrescentou os artigos 18-B, 18-C, 18-D e 18-E.
Importante lembrar que, em seu artigo 13, a Lei Pelé define como entidades do Sistema Nacional do Desporto, aquelas que possuem a finalidade de “promover e aprimorar as práticas desportivas de rendimento”, podendo ser pessoa física ou jurídica, com ou sem fins lucrativos. Assim, são entidades do Sistema Nacional do Desporto o Comitê Olímpico Brasileiro (COB), o Comitê Paralímpico Brasileiro, as entidades nacionais de administração do desporto, as entidades regionais de administração do desporto, as ligas regionais e nacionais, o Comitê Brasileiro de Clubes (CBC),o Comitê Brasileiro de Clubes Paralímpicos (CBCP) e as entidades de prática desportiva filiadas ou não àquelas referidas anteriormente.
Com as alterações feitas no artigo 18, o dirigente, que é aquele que exerce, de fato ou de direito, poder de decisão na gestão da entidade, tem seus bens particulares sujeitos ao disposto no artigo 50 do Código Civil, ou seja, ocorrendo desvio de finalidade ou confusão patrimonial entre os bens da entidade e do dirigente, ocorrerá o abuso da personalidade jurídica, que ensejará a desconsideração da personalidade jurídica, por meio de requerimento da parte ou do Ministério Público. Ocorrendo a desconsideração, as obrigações da entidade serão estendidas aos bens particulares do dirigente, bem como aos administradores ou sócios da pessoa jurídica beneficiados direta ou indiretamente pelo abuso.
Entende-se como desvio de finalidade a utilização da pessoa jurídica com o propósito de lesar credores para a prática de atos ilícitos de qualquer natureza. Já confusão patrimonial é a ausência de separação de fato entre os patrimônios. Caracteriza-se pela transferência de ativos ou de passivos sem efetivas contraprestações e outros atos de descumprimento da autonomia patrimonial.
Com isso, os dirigentes respondem solidária e ilimitadamente pelos atos ilícitos praticados e pelos atos de gestão irregular ou temerária ou contrários ao previsto no contrato social ou estatuto.
Passando aos atos de gestão irregular ou temerária, são aqueles que revelem desvio de finalidade na direção da entidade ou que gerem risco excessivo e irresponsável para seu patrimônio, tais como a aplicação de créditos ou bens sociais em proveito próprio ou de terceiros, obtenção, para si ou para outrem, de vantagem a que não faz jus e de que resulte ou possa resultar prejuízo para a entidade desportiva, celebração de contrato com empresa da qual o dirigente, seu cônjuge ou companheiro, ou parente, em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, sejam sócios ou administradores, exceto no caso de contratos de patrocínio ou doação em benefício da entidade desportiva, recebimento qualquer pagamento, doação ou outra forma de repasse de recursos oriundos de terceiros que, no prazo de até 1 (um) ano, antes ou depois do repasse, tenham celebrado contrato com a entidade desportiva profissional, antecipar ou comprometer receitas em desconformidade com o previsto em lei, não divulgar de forma transparente informações de gestão aos associados, deixar de prestar contas de recursos públicos recebidos.
Compete à entidade do Sistema Nacional do Desporto, mediante prévia deliberação da assembleia geral, adotar medida judicial cabível contra os dirigentes para ressarcimento dos prejuízos causados ao seu patrimônio.
Os dirigentes que praticarem atos de gestão irregular ou temerária poderão ser responsabilizados por meio de mecanismos de controle social internos da entidade, sem prejuízo da adoção das providências necessárias à apuração das eventuais responsabilidades civil e penal. Somente não serão responsabilizados quando comprovarem que não agiram com culpa grave ou dolo, ou seja, deverão comprovar que agiram de boa-fé e que as medidas realizadas visavam a evitar prejuízo maior à entidade.
As alterações trazidas pela Lei nº 14.073, constituem uma importante ferramenta para melhorar o Sistema Desportivo, que muitas vezes tem suas entidades prejudicadas por atos de ingerência daqueles que deveriam zelar e não depreciar as associações que representam. Com isso, espera-se que a possibilidade de ressarcimento pelos prejuízos causados ao patrimônio da entidade e a inexigibilidade por dez anos para cargos eletivos em qualquer entidade desportiva profissional, sejam suficientes para que os dirigentes passem a atuar com responsabilidade, colocando os interesses das associações acima do benefício próprio.