CORONAVÍRUS E OS CONTRATOS – A IMPORTÂNCIA DA NEGOCIAÇÃO EM MEIO A PANDEMIA

Por Letícia Gatto

Com o advento do novo coronavírus (COVID-19) e sua exponencial disseminação global, as relações contratuais passaram a ser parte da preocupação dos empresários; afinal, o evidente desequilíbrio causado pela pandemia nas relações contratuais podem gerar a  necessidade de suspensão ou eventual impossibilidade de execução de algumas atividades, impactando diretamente o cumprimento de acordos firmados anteriormente, além de inúmeros prejuízos para ambos os polos da relação, ainda que nenhuma das partes tenha, de fato, contribuído com o descumprimento.

Assim, dentro da esfera contratual, discute-se a rescisão ou revisão contratual extrajudicial ou judicialmente, valendo-se dos enunciados sobre “força maior” e “fato imprevisível”, conforme previsto nos artigos 393 e 478 do Código Civil Brasileiro (“CC”), respectivamente.

No entanto, o presente cenário, resultante desta pandemia, nos exige maior cautela ao aplicarmos qualquer dos enunciados supracitados. Importante a análise das relações contratuais de maneira individualizada, uma vez que somente após um estudo profundo do caso concreto poderá se concluir sobre eventual impossibilidade da prestação da obrigação previamente pactuada entre as partes ou onerosidade excessiva à uma delas, o que poderia embasar, de fato, a revisão contratual.

Malgrado os princípios comumente aplicados em caso de descumprimento de obrigações contratuais, é preciso valer-se de argumentos que efetivamente justifiquem a impossibilidade do devido cumprimento da obrigação, cabendo analisar não só o mero descumprimento, mas o motivo que o ocasionou, o prazo de duração da impossibilidade de cumprimento e até mesmo a sua extensão.

Na atual circunstância, não há como definirmos uma medida genérica a ser aplicada a todos os contratos, ou menos dolorosa e prejudicial a qualquer uma das partes das relações contratuais, independente de seus objetos. A alteração das circunstâncias de maneira tão expressiva e excepcional gera, sem dúvida, a necessidade de análise individual e pormenorizada de cada contrato, mas sobretudo é necessário o diálogo entre as partes para possibilitar a renegociação de pontos essenciais em um contrato.

A generalização de todas as relações contratuais, a fim de que os contratos sejam obrigatoriamente extintos ou revistos, sem que haja a devida consideração da boa-fé objetiva e o livre exercício do direito de negociação dos contratos, podem configurar atitude leviana. A renegociação e análise detalhada de cada caso específico poderá evitar desequilíbrio que resulte em consequências excessivamente onerosas para um dos lados da relação, como nos contratos diretamente afetados pelas restrições governamentais impostas até o presente momento.

Assim, é mister analisar minuciosamente o ramo do direito aplicável a cada contrato, tipo de atividade desempenhada pelas partes contratantes, a possibilidade de aplicação de novas alternativas para o devido cumprimento da obrigação anteriormente pactuada, mitigação dos riscos, e outras inúmeras considerações a fim de tentarmos garantir a manutenção do equilíbrio econômico entre as partes e evitar, assim, uma onerosidade excessiva.

Por fim, percebe-se que não é possível avaliar a extensão dos impactos da pandemia nas relações contratuais de forma genérica, haja vista que cada caso deverá ser analisado de maneira individual, levando em conta a especificidade de cada contrato, sua natureza, ramo do direito, e possibilidade de repactuação da obrigação.