CLÁUSULAS CONTRATUAIS PARA PROTEÇÃO EM TEMPOS DE CRISE

Por Eduardo Brocchi

Com a pandemia decorrente da propagação do vírus COVID-19, muito se discute sobre quais seriam as possibilidades de proteção contratual para as partes contratantes em situações imprevisíveis durante a vigência do contrato.

As consequências de uma pandemia desta dimensão, que fez com que estados e países declarassem estado de calamidade em todo o mundo, fechassem suas fronteiras e restringissem, por completo, a mobilidade de seus habitantes com a adoção de medidas de Lockdown, extrapolam aquilo que poderia ser projetado para uma relação jurídica contratual.

Ainda que de proporções inimagináveis, a COVID-19 se classifica, por si só, como um evento de força maior, ou seja, um evento imprevisível e inevitável, decorrente das forças da natureza e que não está intrínseco à atividade econômica de qualquer empresa. Este evento ainda pode desencadear outros classificados como fortuitos, agravando ainda mais a realidade de alguns contratos.

Importante frisar que a simples ocorrência de eventos fortuitos ou de força maior não devem ser utilizados como motivação genérica para o descumprimento de qualquer contrato. Tais eventos devem ser diretamente responsáveis pelo impedimento do cumprimento das obrigações estabelecidas.

O direito brasileiro prevê, em seu Código Civil, mais especificamente no artigo 393, que o devedor não responde por prejuízos resultantes de casos fortuitos ou força maior, desde que não tenha expressamente se responsabilizado por eles. Em outras palavras, a Lei afasta somente as perdas e danos decorrentes do descumprimento contratual provenientes de casos fortuitos ou força maior.

Ainda podemos interpretar que não haverá a responsabilidade pela mora se o atraso decorrer de casos fortuitos ou de força maior, conforme artigo 396, também do Código Civil. Evidentemente isso não se aplica se o devedor já estivesse em mora ao tempo da ocorrência do caso fortuito ou de força maior.

Apesar da existência dessas previsões legais, muitas situações encontradas nas relações contratuais não são adequadamente amparadas.

Para que as partes vinculadas por um contrato não fiquem desamparadas na ocorrência, não só de situações extremas como esta do COVID-19, mas de quaisquer eventos que possam ser classificados como fortuitos ou de força maior, os contratos devem trazer elementos aptos a protegerem as partes envolvidas naquela relação jurídica.

Existem diversas cláusulas que podem ser previstas em contratos como forma de proteção das partes envolvidas, considerando o objeto contratual, as partes e o prazo de vigência.

Para a grande maioria dos contratos, como os de prestação de serviços, compra e venda de bens, entre outros, é sempre recomendada a previsão das consequências da ocorrência de casos fortuitos e força maior, além de as partes deverem sempre agir em boa-fé com o objetivo de cumprimento das obrigações assumidas. No entanto, não é comum encontrarmos cláusulas que prevejam, de forma específica, qual seria a condição que desencadearia eventual rescisão de contrato sem consequência para as partes.

Por outro lado, especificamente para operações de M&A, nas quais existe, geralmente, um considerável lapso temporal entre a fase inicial (signing) e a fase final (closing), as cláusulas MAC-MAE (material adverse change / material adverse effect) são ferramentas importantes para a proteção das partes envolvidas.

Basicamente as cláusulas deverão prever em quais situações o comprador poderá desistir do negócio sem que haja qualquer penalidade. Geralmente tais cláusulas são baseadas nos números financeiros e contábeis apresentados pela empresa a ser adquirida, tais como faturamento, lucro, entre outros.

Tais cláusulas são intensamente negociadas pelo fato de poder favorecer em excesso o comprador, que teria considerável vantagem na negociação, podendo desistir ou induzir a renegociação de valores quando observada alteração na situação econômico-financeira da empresa a ser adquirida.

Também com o objetivo de minimizar as consequências de eventuais desequilíbrios nas relações jurídicas contratuais, existem as cláusulas denominadas Sole Remedy, utilizadas principalmente para limitar a responsabilidade das partes por indenizar eventuais perdas e danos causados por atos ao longo da vigência contratual, podendo ser utilizadas, inclusive, para limitar a responsabilidade por danos decorrentes de atos culposos.

Portanto, é imprescindível que as partes contratantes busquem a análise do negócio jurídico para a formatação adequada dos contratos.

Já aos envolvidos em operações societárias, além da negociação inicial dos contratos, é fundamental que reavaliem constantemente a operação e seu cronograma para tentar mitigar quaisquer riscos envolvidos na operação.